terça-feira, outubro 24, 2006

3. Nostalgia do Futuro

Tive na passada semana uma banalidade às escuras, que apesar de tudo correu bem. Durante duas horas falhou a luz por causa de uma tempestade irritante que teimou em gozar com a nossa civilização. Duas horas sem luz, completamente às escuras - nem velas tinhamos no apartamento. Jantámos todos à luz fraca de um carro-lanterna do Noddy que ofereceram ao meu filho. No final fui deitar-me no sofá, completamente às escuras, olhando para o sítio onde pensava estar a televisão.

Nada do que conhecia funcionava - a televisão, o leitor de DVDs, a aparelhagem. O telemóvel só funcionaria enquanto tivesse bateria, e caso o apagão continuasse ficaria também sem telemóvel. Nada incomoda mais uma pessoa hoje em dia do que estar sem telemóvel, por falta de rede ou bateria. Ninguém no seu juizo perfeito escolheria uma casa sem uma das três redes. Tudo o que funciona com baterias só funcionaria enquanto houvesse pilhas em casa.

Apercebi-me de algo simples: toda a nossa fantástica civilização moderna é bastante frágil.

De aqui a alguns anos, os nossos carros serão reduzidos a sucata. Tudo o que produzimos e gravámos em formato digital, CD ou DVD, tem no máximo dos máximos 100 anos de vida. O papel dos nossos livros têm tantos químicos que correm o risco de se despedaçar em algumas dezenas de anos. A probabilidade de os nossos trinetos lerem um livro que foi nosso é bastante reduzida.

E depois temos as nossas construções - o ferro enferruja e o tijolo não resiste muitos anos. Do vidro nem vale a pena falar.

Ou seja, dentro de três mil anos o único vestígio de civilizações passadas será talvez as pirâmides do Egipto, as efígies dos Presidentes dos Estados Unidos no monte Rushmore, o Centro Cultural de Belém e algumas toneladas de lixo radiactivo.