terça-feira, setembro 18, 2007

63. Teimosia selvagem

O cúmulo da teimosia aconteceu na minha vida há dois anos, bem no fim do verão. Curiosamente, deve ser também o cúmulo da estupidez, mas neste sector ainda há muito campo para explorar.

Costumavamos ir para uma praia pouco frequentada nos Pisões. Era um sítio calmo, conhecido apenas pelos pescadores. Naquele ano eu e um dos meus cunhados apontámos um determinado fim-de-semana para levar as tendas e passar lá a noite. Depois de muitos planos, chegou o dia e vimos que estava um bocado de vento, mas nada que impedisse a aventura - afinal tinhamos preparado aquilo há tanto tempo que não seria uma "brisazita" que iria estragar tudo. Afinal, o tempo poderia melhorar de um momento para o outro.

Animados por este pensamento, lá fomos. Dois carros, duas tendas, duas crianças e quatro adultos (dizem as más línguas que eram na realidade seis crianças, mas isso é outra história).

Chegámos, e começámos de imediato a montar as tendas. A famosa "brisazita" tinha-se transformado em temporal que ameaçava levar tudo pelos ares, deformando as tendas e obrigando-nos a por pesos em tudo o que poderia voar. Pusemos os dois carros ao lado das tendas para abrigar alguma coisa do vento e passámos uma boa meia hora a estender um oleado por cima das tendas, para proteger do sol do dia seguinte.

Passo seguinte, fazer o jantar - frango de cabidela. Fabulosos esforços da minha cunhada para impedir que o lume se apagasse no meio do vendaval. E nós ali no meio do vendaval, esfomeados, cansados pela luta contra o vento, tentando esquecer o frio e o vento que batia contra as tendas e tentava levantar o oleado.

Pensavamos todos que o pior tinha passado, mas a natureza é imprevisível. A cerca de um quilómetro, por trás do monte que ficava por trás da estrada nacional começava um incêndio.

Lembro-me de ouvir o meu cunhado comentar "aquilo nunca chega cá". Mas o fumo passou a chamas que desciam o monte, puxados pelo veto que soprava na nossa direcção. Mesmo assim decidimos ficar, à espera do pito.

Só ficámos realmente assustados quando o fumo começou a ir todo na nossa direcção. Nessa altura desmontámos de qualquer maneira as tendas que tinhamos demorado quase uma hora a montar. Dobrámos o oleado, o que seria uma operação simples se o vento não tentasse transformá-lo numa vela negra. Para o impedir a minha mulher pôs-se cima do oleado, que mesmo assim, e numa rabanada mais forte a atirou ao ar, aterrando a dois metros de distância (a bem dizer, foi o baptismo de vôo - e ficou com nódoas negras para o provar...).

Depois de tudo arrumado à pressa nos carros, a minha mulher pôs o panelão da cabidela ainda a ferver entre as pernas e fugimos em direcção a Amares.

Prólogo

No fim de semana seguinte o meu cunhado voltou a essa praia, constatando que o fogo tinha galgado a estrada e chegado ao sítio onde nós tinhamos tentado acampar.

Ou seja, até mesmo no campismos selvagem, o crime não compensa...