sexta-feira, novembro 30, 2018

490. Caminhos de Braga

    Saí da sala onde decorrera o evento com a firme convicção de que o trabalho proposto seria simples. Afinal, o que seria mais simples do que falar daquilo que se faz todos os dias? A constatação do meu erro foi quase imediata: como se encontra a relevância no que para nós é banal? Foi com esta dúvida na cabeça que atravessei o Largo de São João do Souto debaixo de uma chuva incessante. Puxei o capucho para cobrir a cabeça, ignorando o impulso de tirar o pequeno guarda-chuva de senhora que, num acto de desespero, tinha guardado na mochila. Queria sentir a chuva a cair e esta fez-se sentir. Dizem que Braga é o penico dos céus. Tive a prova disso no pequeno percurso que fiz até ao carro, como se São Pedro me quisesse pôr à prova para aumentar a autenticidade do relato.

    Segui pela rua do Anjo, passando pela famosa igreja de Santa Cruz, construída no Séc. XVII num estilo barroco maneirista. Reza a lenda que na sua fachada existem três galos em alto relevo e que a moça casadoura que os descubra tem casamento marcado para breve. Ignorei a fachada - já tinha descoberto os galos antes e, feliz ou infelizmente, nada acontecera e o meu estado civil manteve-se intacto. Dois turistas estavam na esquina da rua do Anjo, junto à famigerada fachada, mas estavam entretidos a tirar selfies à chuva. Fazem milhares de quilómetros para tirarem fotografias que podiam ter feito em casa, apontando a máquina para o espelho. Escapa-me o interesse destas novas tecnologias, penso, enquanto sigo pelo estreito passeio de granito irregular da Rua do Anjo. Os turistas seguem pelo mesmo trajecto, tentando ver algum motivo de interesse naquilo que eu já sabia não ter. Passo pelo largo de Santiago, depois sigo pela Rua do Alcaide, onde duas obras me obrigam a ziguezaguear entre os dois passeios, prova de que a cidade se está a renovar. Mais à frente chego ao largo de Paulo Orósio (e não Osório como alguns insistem em chamar). No meio do largo, uma estátua recente de Júlio César, que é o equivalente a colocarem uma estátua de Hitler no centro de Varsóvia. Para além da estupidez do acto, a mesma estátua é de uma estética duvidosa que em nada prestigia a cidade, no meu entender e do de outras pessoas cuja opinião me lembro de ter lido nas redes sociais e, sendo feita de plástico, sujeita a acidentes como o que aconteceu recentemente, para gáudio de muito boa gente.

    Passo em seguida pelo parque radical, complexo situado em Maximinos e que, além de diversas estruturas para práticas desportivas, ostenta um conjunto de grafittis de gosto duvidoso e uma escultura que tem uma ligação à cidade que me escapa: a de uma garrafa de coca-cola do tamanho de um homem.

    Cheguei ao carro completamente encharcado e com fortes dúvidas sobre o trabalho que me tinha sido pedido. O resto do caminho foi feito por uma via rápida que atravessava todo o vale de palmeira, único reduto dos arredores de Braga que ainda não foi tomado pela urbanização agressiva. A conquista, no entanto, já foi iniciada, primeiro com a construção do estádio numa pedreira (e que resultou, na minha opinião) no desperdício de uma boa pedreira. Depois do estádio começaram a aparecer grandes superfícies como se de uma metástase se tratassem, culminando no Nova Arcada, um centro comercial que veio desviar o pouco comércio que havia no centro da cidade.

    Depois do Nova Arcada, a paisagem muda. A alteração é visível, mesmo debaixo da chuva que teima em não querer parar. De repente a rusticidade dos campos de cultivo torna-se predominante, especialmente depois de atravessar o rio Cávado. Ao entrar em Vila Verde dou-me conta do aumento do trânsito, próximo da zona do Alívio, estranho nome para quem está parado à espera que o sinal vermelho das obras mude. Opto por um atalho que é substancialmente mais longo, mas com a vantagem principal de não ficar parado e a vantagem adicional de me lavar a alma com algumas das paisagens mais rústicas das redondezas - sinal irrefutável de que estava em casa.

quarta-feira, dezembro 24, 2014

488. Fólicos Capilares

Assisti hoje a uma conversa do mais alto nível sobre cuidados a ter com fólicos capilares. Parecia que estava numa consulta de dermatologia, mas não. Estava na fila do supermercado e o caixa dava conselhos com evidente conhecimento de causa ao cliente que estava à minha frente.

Longe vão os tempos em que o caixa tinha o nono ano. Hoje temos doutores a passar o arroz e o feijão nas máquinas registadoras, um pouco por esse país fora. 

terça-feira, novembro 11, 2014

487. Surrealismo badalhoco

Devo ter princípios à antiga. Só pode. Hoje de manhã estaciono o carro no sítio de costume, nas traseiras de um café da moda de Braga. No passeio já tinha visto garrafas que os clientes espalhavam durante a noite, numa cópia de um costume espanhol. Mas de ver as garrafas a senti-las a partir por baixo dos pneus do carro vai uma distância que não me interessava percorrer. Paro o carro e olho para trás. Havia um monte de garrafas partidas no sítio onde tinha passado com o pneu. Como não as tinha visto, presumo que já outro carro tinha passado por cima delas.

Olho para o lado, e vejo outro monte de garrafas, atrás de um outro carro. Como tinha visto uma senhora da limpeza das ruas na rua imediatamente anterior, fui falar com ela. O diálogo, absolutamente surrealista foi algo como:
Eu: "Bom dia, estão ali vidros de garrafas, depois da curva."
Ela, enquanto limpava pacatamente folhas do passeio: "Eu sei, juntei-as em montes. Quando passar por lá, apanho-os."

Fui aos arames. Para facilitar o seu serviço, esta criatura tinha feito montes de garrafas por trás de carros, sem nunca lhe passar pela cabeça que os condutores podem não ver os montes. E mesmo se os vissem: iam andar a colocá-las novamente nos passeios?

Conclusão: devo ter mesmo princípios à antiga, e um mau feitio do pior. Só pode. (E, quem sabe, dois pneus furados.)

terça-feira, outubro 08, 2013

486. Progresso

Até há relativamente pouco tempo tinha a tradição de ir passar uma semana de férias no parque de campismo da Torreira. Gostava da calma da povoação, da areia branca das praias sem aquele tumulto de gente nas praias mainstream mais a sul, aquelas onde parece mal nós não irmos - mas o que é um facto é que, durante muitos anos, a Torreira era o nosso paraíso e pronto, não havia nada a fazer. Entalada entre o mar e a ria, numa língua de terra com 1 km de largura, tem um encanto que não consigo encontrar em qualquer outra terra. Por mais que digam que o mar é bravo ou que os fins de tarde são ventosos - dois factos que assumo, a calma com que regresso depois de uma temporada lá cura todos os males. Só o facto de pararmos o carro e irmos a pé para a praia, sem qualquer preocupação com estacionamentos ou atropelos de qualquer ordem, vale, sinceramente, a pena.
E, depois, temos o parque. Conheci-o há muitos anos, durante umas férias no grupo de jovens. Apaixonei-me instantaneamente pelo sítio e gostei do parque. Podia ter casas de banho antiquadas, mas eram limpas por gente que não incomodava os campistas. A zona sul do parque era ocupada pelos campistas residentes, que ficavam todo o ano e tinham as suas tendas arranjadas como se fosse uma aldeia onde todos se conheciam. Era simpático passear por entre estas tendas, gradualmente arranjadas para aumentar o conforto, muitas delas com motivos díspares que lhes davam um ar simpático. Dava gosto cheirar o cheiro dos grelhados e ouvir as conversas de gente que se conhecia há muito. Nós tinhamos a nossa tenda que tentavamos sempre montar próximo dos campistas residentes, longe das confusões das zonas mais afastadas onde os miúdos organizavam bebedeiras e festas mais ou menos ruidosas. Lembro-me de uma noite. É interessante que só me lembre desta noite. Os vizinhos começaram a imitar o som de animais. Nós ajudámos à festa e rapidamente o parque começou a parecer  um zoológico onde nós eramos os animais. No final fomos para a cama com o coração partido pelo facto de que, no dia seguinte, teriamos de montar a tenda e sair. Tinhamos a esperança de voltar no ano seguinte, mas não sabiamos que iria ser a nossa última noite no parque. No ano seguinte, quando chegámos para montar a tenda, encontrámos o parque em obras. Desanimados, procurámos outro poiso, ali perto, mas a magia tinha-se quebrado. As obras duraram anos. Quando tive conhecimento de que as mesmas tinham acabado, voltámos lá, esperançosos de que iriamos encontrar um parque ainda melhor - afinal, é para isso que se fazem as obras, certo? Errado, muito errado. À chegada fomos informados de que o parque ainda não tinha condições. Mas o pior ainda estava para vir. O parque tinha sido completamente remodelado por quem nunca tinha acampado na vida. A zona dos campistas permanentes tinha sido transformado num amplo parque de estacionamento de auto-caravanas. As árvores tinham sido cortadas. O parque tinha sido, pura e simplesmente, assassinado. Chamam-lhe progresso, mas dispenso este tipo de progresso.

segunda-feira, agosto 13, 2012

485. Cães


A rua estava escura – os cortes da crise tinham obrigado a isso e a Lua não ajudava. As luzes do carocha do meu tio eram as únicas coisas que iluminavam a estrada, como se fossem as únicas luzes que existiam no mundo. À nossa frente apareceram sombras brancas, movendo-se lentamente para a berma da estrada, em fila indiana. Cinco cães, quatro pequenos e um grande, a liderar. Um sexto estava no meio da estrada, evidentemente morto, os outros tinham o ar de quem tinha estado a se despedir e olhavam para nós com um misto de recriminação e mágoa. 

A dor de perder alguém não escolhe raças nem espécies. 

O respeito é universal. 

Só nós não entendemos isso: continuamos a pensar que tudo é nosso, um umbiguismo míope e desconcertante. 

sábado, junho 23, 2012

484. A triste teoria da mosca

Com esta história da crise, são cada vez mais as pessoas que não encontram saídas para as suas situações. Tentam sempre recuperar os seus padrões de vida, sem perceberem que as regras mudaram. A sociedade está fragmentada: são as próprias pessoas que têm de procurar o seu lugar, porque os lugares que havia antigamente estão fechados.
Ao almoço vi uma mosca que tentava sair para o exterior, pelo vidro entreaberto da janela. Bastava-lhe voar um bocado para ter uma outra perspectiva das coisas e encontrar um caminho de saída; mas não, ficou o tempo todo a bater contra o vidro.
Custa-me pensar que podemos não ser mais espertos do que uma mosca.

sábado, janeiro 28, 2012

483. Não sei se o mundo vai acabar em 2012

Não sei se o mundo vai acabar em 2012, mas está tudo a ficar tolo, pelo que alguma coisa deve estar para acontecer. 

Não é normal que um presidente da república dê cabo da sua reputação tendo pena da sua reforma, quando na realidade ganha várias vezes mais do que o português médio.

Não é definitivamente normal que um capitão de um cruzeiro dê cabo do seu navio estatelando-o contra as rochas, para que um membro da tripulação possa ter uma visão privilegiada da sua ilha natal. 

E não é normal que a filha do maior futebolista português de sempre venha a público dar uma entrevista num evidente estado de embriaguez. Sobre este último caso, nem quero pensar que este seja o estado normal da senhora.




Portanto, não sei se o mundo vai acabar em 2012, como afirmaram os Maias (também nunca gostei muito do livro), mas parece que vai ser um ano divertido (se não formos engolidos pela crise de que tanto se fala)...

PS - Não é também normal que um jogador do Sporting imponha a sua vontade sobre a vontade do treinador no momento de marcação do penalty, e que depois falhe, naquela que vai ser chamada para sempre de "Técnica de Bojinov" ( Video )

PS2 - Deve andar por aí um vírus da estupidez... pelo que tenham cuidado e protejam-se. Leiam um livro...

terça-feira, dezembro 06, 2011

482. Este mundo está podre

Acho alguma piada ao histórico das palavras chave que fazem com que as pessoas encontrem este blog. Este mundo está PODRE...


swing em viana do castelo
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